[Um poema de Pedro Rena, escrito na oficina O cinema da escrita, oferecida por Carina S. Gonçalves, a respeito do filme "Andy Warhol comendo um hambúrguer"]
um homem comendo um hambúrguer
sua expressão é algo
elegante algo
constrangida algo
cínica
andy warhol comendo um burguer king
o rei da pop art comendo o popular hambúrguer rei
se lermos literalmente o ditado
“você é o que você come”
o vídeo não é sobre uma simples refeição
é sobre um gesto antropofágico
sobre um gesto caro ao trabalho do artista americano
que tudo mastiga
tudo engole
tudo vomita
transformando o pop em arte
o trash em cult
o banal em cinema
ele abre o hambúrguer
para colocar o ketchup fora do hambúrguer
abre a publicidade
para colocá-la fora da publicidade
sua expressão comendo o hambúrguer é algo
elegante algo
constrangida algo
cínica
ele parece saber que seu vídeo não é apenas
sobre um homem comendo um hambúrguer
mas sobre uma imagem devorando outra
ele amassa o papel e o descarta
imaginando talvez que ele próprio
é um sujeito descartável
imaginando que ele próprio
possa ser engolido
pela indústria cultural
imaginando que quarenta anos depois
seu filme poderia virar uma publicidade barata
do super bowl
nesse pequeno vídeo
warhol parece nos apresentar sua poética
que se alimenta da fama de suas modelos
para depois descartá-las
como hambúrgueres
amassados
warhol nos encara
depois de comer o hambúrguer
e descartá-lo
talvez sabendo da perversidade
do seu trabalho
sua expressão é algo
elegante algo
constrangida algo
cínica
Pedro Rena é formado em Letras, com formação complementar em Comunicação Social pela UFMG. Foi bolsista do programa de extensão forumdoc.ufmg e integrou coletivo Cineclube FAFICH. Organizou a mostra “68 e depois” no Cine Humberto Mauro em 2018. Atua como designer gráfico e assistente de câmera